PROPOSTA
DIDÁTICO-PEDAGÓGICA DE ENSINO DE BIOGEOGRAFIA NA GEOGRAFIA ESCOLAR: O VIOLÃO
COMO RECURSO DIDÁTICO
Rafael de Souza Alves
Licenciado em Geografia pela
Universidade Federal de Viçosa
Integrante do Laboratório de
Biogeografia e Climatologia – BIOCLIMA UFV
E-mail: rafael.s.alves@ufv.br
Introdução
“Não
posso ser professor sem me pôr diante dos meus alunos, sem revelar com
facilidade ou relutância minha maneira de ser, de pensar politicamente. Não
posso escapar à apreciação dos alunos. [...] Daí, então, que uma de minhas preocupações
centrais deva ser a de procurar a aproximação cada vez maior entre o que digo e
o que faço, entre o que pareço ser e o que realmente estou sendo” (FREIRE,
1996, p. 96)[1].
O presente texto
consiste em uma síntese da oficina de mesmo título proferida para alunos da
Escola Santa Rita de Cássia, localizada em Viçosa-MG, tendo como público alvo
estudantes de diferentes idades e nível da educação básica. Em um segundo
momento, a experiência foi compartilhada com os graduandos em Licenciatura do
curso de Geografia da Universidade Federal de Viçosa, também bolsistas do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência (PIBID).
A música e os
instrumentos musicais, de modo geral, sempre fizeram parte de meu universo
familiar e social. Dessa forma, a construção da oficina, tendo o violão como um
recurso didático, revela a aproximação do “eu” professor com o “eu” sujeito
social, distante do ambiente profissional; ela é uma singela aproximação entre
o que sou e o que faço, e também uma expressão de minha maneira de ser –
profissional e pessoal.
Momentos
Precedentes
A elaboração da oficina
iniciou-se com uma pesquisa detalhadas sobre violões, buscando respostas para
as seguintes perguntas: Porque em cada parte do instrumento se utiliza um tipo
específico de madeira? De qual Bioma ou Domínio Morfoclimático provem tais
madeiras? Como a relação entre sociedade e natureza se manifesta dentro dessa
temática?
Para direcionar as
investigações e também aproximar os alunos do recurso didático estabelecido,
foram realizados maiores estudos e pesquisas sobre o violão que possuo, sendo
ele da marca Holfma, modelo HM 210 NT. Não seria pertinente discutir os
questionamentos levantados anteriormente a partir de outro violão qualquer, que
não fosse possível de leva-lo para a oficina. Isso, porque o violão foi adotado
como artefato a permitir uma relação escalar, entre o local e o global, e
também como veículo a reportar os discentes aos Biomas a serem discutidos. Parte
das fontes de pesquisa utilizadas na estruturação da oficina foram sites de
fabricantes de instrumentos musicais (madeiras e processo de fabricação), lojas
de vendas de violão (preço de mercado) e blogs de Luther.
O
Desenvolvimento da Oficina
Inicialmente foi
realizada uma discussão com os estudantes a partir da pergunta: “o que é a
Biogeografia?”. Para subsidiar o diálogo foi utilizada a figura 1 como recurso
visual. Na ocasião foi feita uma discussão do papel do Homem a distribuição
espacial dos seres vivos na superfície da Terra, bem como a maneira em que a
Biogeografia está presente nos livros didáticos. Vale ressaltar que na ocasião,
não cabe uma discussão epistemológica junto aos estudantes da educação básica a
respeito da Biogeografia, haja vista que esse não é o propósito da Geografia
Escolar.
Figura 1. Figura
utilizada para subsidiar a discussão a respeito do que é a Biogeografia
O momento seguinte foi
a apresentação do que seria discutido ao longo da oficina, sendo a
relação entre sociedade e natureza a partir do violão da marca Hofma, modelo HM
210 NT, enfatizando:
1. a
matéria prima (madeira) para a fabricação do mesmo e as características do
Bioma de onde ela é extraída;
2. o
processo de seleção da madeira e cuidados na extração;
3. a
relação entre disponibilidade dos recursos na natureza (madeiras), manuseio da
madeira pelo Luthier e custo final do instrumento.
O instrumento foi
apresentado aos alunos em uma discussão a respeito da sua marca, qualidade
sonora, relação custo benefício e madeiras utilizadas para a sua construção. A
madeira indica o básico, a natureza sonora do violão e suas características
iniciais como timbre, volume e ataque. As partes que constituem o instrumento são
(Figura 2):
Figura 2. Partes constituintes de
um violão
Depois de apresentado
as partes que compõem o violão foram elencadas as madeiras nele existentes e o
Bioma onde são encontradas:
- Tampo –
madeira de nome Abeto – Floresta Temperada;
- Lateral e
Fundo – madeira de nome Nogueira – Floresta Temperada;
- Braço e Mão
– madeira de nome Mogno Oriental – Floresta Equatorial (Amazônia);
- Escala e
Rastilho – madeira de nome Jacarandá-da-Bahia – Mata Atlântica;
Na sequência foi
discutida as características de cada Bioma onde são encontradas as madeiras
para a fabricação do violão em cena, com destaque para o nível de degradação da
vegetação e suas consequências.
A título de exemplo
podemos aqui destacar o Jacarandá-da-Bahia. Essa madeira tem se tornado padrão
de qualidade máximo na fabricação de violões, sobretudo quando empregada na
lateral e fundo dos instrumentos. No entanto, os violões fabricados utilizando
quantidade significativa do Jacarandá-da-Bahia tendem a ter preços baste
elevados, muito em função das dificuldades em encontra-la no ambiente, fazendo
com que ela chegue a custos elevados às mãos dos fabricantes e posteriormente
aos consumidores.
A escassez do
Jacarandá-da-Bahia está intimamente relacionada ao processo histórico de
devastação da Mata Atlântica, atualmente reduzida a cerca de 7% de sua formação
original. Dessa forma, a relação entre sociedade e natureza estabelecida em
áreas de domínio da Mata Atlântica levou a uma baixa disponibilidade da matéria
prima de alta qualidade para a fabricação de violões. Analogias como essas
foram feitas na discussão de todos os Biomas elencados acima, com o devido
cuidado nas afirmações, pois a madeira não é o único elemento a influenciar no
preço de um violão.
Considerações
Finais
A aplicação da oficina
mostrou-se pertinente por ter abordado uma situação próxima ao cotidiano dos
discentes, sobretudo por está relacionado a música, levando-os a se
interessarem pela temática discutida.
Foi observado que nos
momentos de manuseio do violão, como demonstração de sua partes componentes, marca,
qualidade sonora, o envolvimento dos estudantes era maior, em comparação aos
momentos de discussão das características dos Biomas. Dessa forma, a
experiência mostrou que é preciso repensar a maneira de discutir os aspectos
gerais referentes aos Biomas.
[1] FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários
à prática educativa. 30 ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.